segunda-feira, 24 de outubro de 2016

O campesinato no cenário de luta em defesa da terra e da liberdade

     
(Foto: Sebastião Salgado)
A trajetória de lutas do movimento camponês brasileiro é na verdade a história da luta pela liberdade propriamente dita, contra o sistema escravista, pela posse da terra, contra o latifúndio, pelos direitos trabalhistas, por autonomia política e contra o voto de cabresto, pela igualdade e contra o preconceito racial, pelo direito a vida e contra a exploração dos oprimidos, pela invisibilidade e reconhecimento da identidade, pela memória de lutas, contra a história distorcida e pela verdade dos fatos ainda apagados na história, contra a impunidade e pela justiça... contra toda e qualquer tirania.
     O sangue derramado por muitos companheiros fez com que tivéssemos nos dias de hoje todas essas conquistas no que diz respeito às politicas púbicas para a classe mais pobre do país; infelizmente a burguesia e os setores capitalistas nunca aceitaram que o filho de um camponês se tornasse advogado, médico e outros títulos durantes séculos negados para os índios, negros, assentados e periféricos. A negação do direito social e participação política em alguns casos da história foi o estopim para muitas insurreições... camponeses foram obrigados em suas consciências a pegar em armas para defenderem suas honras, seus direitos sociais como cidadãos e cidadãs. O fato de pegar em armas para lutar pela liberdade sempre foi o momento mais extremo da história das civilizações em busca do direito e da liberdade, mas não devemos esquecer que também sempre foi esse fato o mais importante das guerras e decisões. Lembremos então para reflexão dos muitos casos de conflitos, movimentos e lideranças que fazem parte da memória camponesa durante a trajetória de formação do país, passando pelo Estado Novo de Getúlio Vargas e seguindo os períodos de transição de 1946 a 1964 com o golpe militar e as resistências contra a Ditadura Militar até 1985.
     Antes do golpe, os trabalhadores rurais do Brasil estavam num processo crescente de luta pela Reforma Agrária e por direitos sociais. Com a ditadura, a repressão conjunta de militares e latifundiários se abateu pesadamente sobre eles. Muitos foram presos e outros tantos assassinados. Mas, quando se fala sobre repressão e resistência nessa época, muitas vezes as lutas e as violações de direitos humanos ocorridas nas zonas rurais são esquecidas e isso ainda vem acontecendo em nossos dias. Outro fato importante da história de luta dos trabalhadores rurais foi, em 1960, quando surgiu o “Movimento dos Agricultores Sem Terra”, no Rio Grande do Sul, com o apoio do governador do estado o saudoso Leonel Brizola, que era favorável à Reforma Agrária. Essa organização, que chegou a contar com mais de 100 mil associados, conquistou muitas vitórias, como desapropriações de terras improdutivas e assentamentos fundiários.
     Em novembro de 1961, realizou-se o 1º Congresso Nacional dos Trabalhadores Rurais, em Belo Horizonte, reunindo 1.600 participantes. Entre eles, estavam representantes da União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil (ULTAB), hoje transformada na CONTAG; compareceram membros das Ligas Camponesas, do MASTER, do movimento estudantil e da ação católica que na época tinha muitos trabalhos de formação realizados no campo brasileiro. Dali os trabalhadores rurais ganharam espaço político; o governador Magalhães Pinto cedeu o local para a reunião, o presidente Goulart compareceu acompanhado de Tancredo Neves e defendeu em seu discurso a Reforma Agrária.
     Em março de 1963, o governo Goulart assinou a lei que criava o Estatuto do Trabalhador Rural. Dando favorecimento os direitos dos trabalhadores rurais assim como os dos urbanos, garantindo registro em carteira profissional, salário mínimo, horário de trabalho e descanso, férias anuais, 13º salário e direito à sindicalização. Para fazer frente às Ligas Camponesas, o governo apoiou um movimento de sindicalização rural. Muitas delas trataram de se organizar e, em 1963, já se somavam 557 sindicatos de trabalhadores rurais. No mesmo ano, o governo federal iniciou uma verdadeira batalha parlamentar para aprovar a reforma agrária. Paralelamente, as Ligas radicalizaram suas ações. Ocuparam engenhos e enfrentaram ataques policiais em vários estados do Nordeste. Essa radicalização não teve apoio suficiente e levou a um isolamento de Francisco Julião – líder supremo das Ligas, o que fez com que elas no momento perdessem força. Os latifundiários promoveram perseguições e assassinatos de lideranças. Um caso exemplar dessas ações de extermínio de lideranças foi o de João Pedro Teixeira. O presidente da Liga de Sapé, da Paraíba, foi assassinado em 1962. Sua mulher, Elisabeth, o substituiu na luta.                                                      
     No Maranhão, nosso estado, a Reforma Agrária tem suas pendencias desde a década de 60 e 70, quando os governantes da época venderam grandes áreas de terras para empresas do centro e sul do país. Para isso melhor dizendo, devemos relembrar a luta do companheiro MANOEL DA CONCEIÇÃO, homem que foi baleado, preso, amputado, torturado e exilado. Um sobrevivente da ditadura militar (1964-1985). Manoel da Conceição, líder camponês do interior do Maranhão, cuja história é contada no relatório da CNV (Comissão Nacional da Verdade). Os abusos cometidos contra o lavrador nos porões da ditadura chamaram tanto a atenção na década de 1970 que o papa Paulo VI chegou a intervir a seu favor e pedir sua libertação. Ele era de família evangélica, seguidora da Assembleia de Deus, Conceição presidia o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Pindaré-Mirim, quando os militares tomaram o poder em 64. Formado na luta pela reforma agrária, a organização era o primeiro sindicato rural da história do Maranhão. De imediato, o Exército ocupou a sede da entidade e ali ficou por 60 dias. Duzentos lavradores foram presos. Somente no mês de junho daquele ano, Conceição foi preso cinco vezes na cadeia municipal. Mesmo fechado pela ditadura, o sindicato tinha quatro mil filiados em 68, quando a polícia invadiu uma de suas sedes e baleou o dirigente na perna direita. Após seis dias preso e sem ser medicado, teve de amputar a perna. Nesta época, Manoel da Conceição e outros lavradores integravam a organização de esquerda Ação Popular. Naquele tempo o Estado era governado por José Sarney. Desde muito tempo o Maranhão passa por uma crise no que diz respeito às questões fundiárias, um dos campeões de assassinato no campo, assim como o Pará que lidera esse crime, que também não é diferente de todas as regiões do país.

José Antonio Basto
e-mail: bastosandero65@gmail.com
                                                                                                                                           



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