terça-feira, 16 de janeiro de 2018

O bacuri chegou!

Bacuri de São Raimundo
A temporada começa agora nesses meses de janeiro a março – as comunidades se alegram com mais uma renda para as famílias camponesas. Os frutos despencam dos galhos e se esparram sobre o chão limpo da chapada. Os extrativistas saem cedo com seus cofos para a colheita do fruto especial da Região do Baixo Parnaíba maranhense. Rica em vitaminas, o bacuri é nativo da floresta tropical amazônica, pouco maior que uma laranja, com pele mais espessa de uma cor amarelo-limão pertence à família (Guttiferae), oferece muitos benefícios para a saúde, usado também em cremes, geleias, doces, bolos, purê e licores.
O bacurizeiro, conhecido cientificamente como (Platonia insignis) pode atingir mais de 40 metros de altura, com tronco de até 2 metros de diâmetro nas árvores mais desenvolvidas. Sua madeira considerada nobre também tem variadas aplicações, mas é proibida a derrubada de sua árvore. É encontrada naturalmente desde o Piauí seguindo a costa do Pará até o Maranhão.
Audiência Pública em São Raimundo - 2015
A polpa possui alguns nutrientes em ​​quantidades notáveis de
fósforo, potássio, ferro, cálcio e vitamina C; a casca também é aproveitada na culinária regional e o óleo extraído de suas sementes é usado como anti-inflamatório e cicatrizante na medicina popular e na indústria de cosméticos. Comunidades tradicionais de Urbano Santos como São Raimundo, Boa União, Bom Princípio e Bracinho, além de outros povoados praticam o extrativismo do bacuri – aumentando a renda, além de uma alimentação saudável. Um dos problemas nesse período de safra é a derrubada do fruto ainda verde. As comunidades devem tomar conhecimentos dos problemas caudados no meio ambiente que a derrubada do bacuri verde traz. Quando se derruba o fruto verde antes de madurecer maltratando seus galhos a árvore não consegue brotar no ano seguinte, daí as famílias poderão perder no futuro parte de sua renda causando assim a escassez ou talvez o desaparecimento da espécie.
Saboreando bacuri - Diretoria - STTR
A massa do bacuri é muito cobiçada nessa temporada de colheita, chegando a 20 reais o kg. Por isso a grande procura pelo fruto. Surgia uma ideia em 2015 com ênfase na elaboração coletiva de um documento oficial que rege principalmente sobre a “proibição da derrubada” do fruto do bacuri verde nessa temporada da safra. Com o texto preparado sob orientações da SMDH – Sociedade Maranhense dos Direitos Humanos e apoio do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores (as) Familiares de Urbano Santos, resolve-se alargar os capítulos dando assim um entendimento mais amplo da proteção de uma toda biodiversidade. Com base em leis estaduais, federais e na própria Constituição de 1988, o documento subdivide-se nos seguintes subtítulos: “DA PRESERVAÇÃO DO BACURI, DO PEQUI E OUTROS RECURSOS AMBIENTAIS (MINERAIS, VEGETAIS E ANIMAIS; DAS CONDUTAS PROIBIDAS E PENALIDADES; DA FISCALIZAÇÃO E DISPOSIÇÕES GERAIS”. Com o sucesso dessa primeira experiência, outras comunidades estão solicitando audiências públicas para tratar desse assunto como a próxima que será realizada dia 31 de janeiro de 2018 no Povoado Juçaral. Abrangendo os Territórios dos Povoados Juçaral, Bebedouro, Laranjeira, Santa Rosa Bacabal, Surrão, Marçal dos Onças, Pedra Grande, Cajazeiras, Todos os Santos e outras comunidades interessadas da região.


José Antonio Basto

quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Lendo para entender a chapada de forma diferente

O caminheiro depois de muitos dias de viagem pelo leste parava numa humilde choça das paredes de taipa e coberta de palha de babaçú. Se hospedaria ali naquela tijupá para repousar a noite e mais tarde seguir adiante, pois seu dia tinha sido bastante cansativo, percorrera toda aquela densa região de conflitos, acumulando o aprendizado. Era um herói? Talvez, com modéstia – esperava algumas mudanças e reformas que favorecessem os menos favorecidos e desprovidos de direitos. Este é um ofício que escolhera na esperança de novos tempos para colher bons frutos no futuro. Ao se abancar, perguntaria aos anfitriões do lar sobre a questão da terra – a conversa começaria antes do jantar que fora oferecido, pois jamais se dispensaria uma tradicional Iguaria de “galinha caipira com arroz de pequi” a pesar de tudo estava na chapada. A janta saiu com perfeição à luz de lamparina. Satisfeito! Em seguida surgia uma provocação que envolveria a situação fundiária do lugar. Poucos discutem sobre esse assunto que decerto é polêmico desde tempos bem remotos na história das civilizações; respeitava-se o momento – deixando-os à vontade. Mas as respostas supriam as indagações e a “prosa” prosseguira até o fim. O Viajante tirava de seu alforje alguns livros, textos, revistas e jornais velhos – veículos estes que alimentariam o gosto pela leitura e daria uma injeção de ânimo na luta pela posse da terra. Presenteava-os com carinho; recusaram de início, pois não sabiam ler nem escrever – descobrira então, óbvio! Mas respeitosamente aceitaram os presentes e os guardaram num baú seguro, pois dali tiveram a curiosidade de aprender a ler em uma demorada relação com as palavras e com a gramática. Só assim demonstrariam força intelectual e social para destrinchar os processos burocráticos no que diz respeito a defesa do seu território. Não conheciam o mundo das letras – e nunca leram nada – muito menos pisaram na escola; mas sabiam de cada pé de árvore da chapada – mostravam seus saberes e técnicas no extrativismo repassados de pai para filhos – curavam-se com remédios tirado das plantas medicinais – seus pais lhe ensinaram; não se perderiam nas veredas nem de dia, nem de noite, a energia era a luz da lua e das estrelas. Caçavam, pescavam, lavravam o chão e criavam pequenos animais para a alimentação e reprodução da família, o que detinham de mais valioso era toda aquela terra. Soletravam “lendo para entender a chapada de forma diferente”, coisas que a escola não ensina, adquiriram o diploma com o tempo. A existência e a convivência ensinaram essa nobre literatura onde uma minoria dar valor. Escreve-se para quem disponibiliza um tempinho pra ler. Conversavam ao seu modo com a natureza numa comunhão e comunicação com o espaço em que vivem. Sabiam a hora pelo sol e o tempo de plantar e jogar a semente no período certo através do clima. Viviam Isolados do mundo civilizado e conectados com o meio ambiente. A cartilha era a própria terra, as folhas, os ventos, a enxada, o jacá e as chuvas de inverno. Formaram-se em todas as ciências, receberam prêmios valiosos e repassaram isso para as futuras gerações. Tiveram como mestres o tempo e a paciência que lhes ensinaram a mais bela das lições de vida.

José Antonio Basto

e-mail: bastosandero65@gmail.com