segunda-feira, 31 de julho de 2017

Tucanos do Mocambo: a saga dos tucanos-vaqueiro, uma espécie ameaçada de extinção

Tucanaçu - (imagem da web)
Desde criança não os via, a espécie estar em perigo de extinção, alguns pássaros já desapareceram da região como o curió, primavera, guriatã, xexéu e muitos outros que eram comuns por aqui. Na Comunidade “Olho D`água” – Urbano Santos, localizada às margens do Rio Mocambo eles voam livremente – longe dos impactos ambientais causados em seus habitats, cantam a procura de alimentos e brincam sobre as árvores numa acrobacia incrível. Os “tucanos-vaqueiro” que assim são conhecidos no sertão vivem a procura de lugares seguros junto às matas do rio – eles partem migrando em bandos vindos de áreas que deram lugar à soja em Baixa Grande. Conversando com os mais velhos do povoado, me diziam que antigamente existia bastante tucanos nas matas e nos babaçuais da região, mas ultimamente os tucanos entraram na lista dos animais em perigo de extinção.
Esses pássaros são protegidos por lei, poucos sabem disso – outros nem sabem, ajudam no equilíbrio da natureza e na existência da biodiversidade. Atravessaram as fronteiras das comunidades escapando dos venenos do agronegócio... Dos impactos ambientais que tanto lhes prejudicam. Cientificamente os “tucanos” são registrados como/por (Ramphastos toco), tradicionalmente no Maranhão a espécie mais conhecida recebeu o nome de “tucanuçu” (grande), ou “tucano-vaqueiro”, como já citado acima – razão pelo qual o animal faz um barulho imitando o “aboio de vaqueiro”, este portanto sendo o maior dos tucanos, medindo mais ou menos 56 centímetros de comprimento e 540 gramas.
Os tucanos podem ser encontrados na Amazônia e principalmente no cerrado brasileiro. Possui um enorme bico alaranjado (cerca de 15 centímetros) com uma mancha preta na ponta. Sua plumagem é negra, com o papo e o uropígio brancos, a área ao redor dos olhos laranja e as pálpebras são azuis, vivem quase sempre em bandos e se alimentam de frutas do cerrado, complementando a dieta com alguns insetos e pequenas presas.
As mudanças climáticas e impactos socioambientais da monocultura do eucalipto e soja na Região do Baixo Parnaíba maranhense tem alterado os comportamentos e modos de vida de muitos animais silvestres como as várias famílias de pássaros que já não existem mais. Fenômeno esse que há mais de três décadas tem contribuído com tantos outros problemas relacionado à situação ecológica e agrária na região.

José Antonio Basto



segunda-feira, 24 de julho de 2017

O Viajante, as águas do Mocambo e as trincheiras da guerra

Rio Mocambo cheio - U. Santos - (Imagem: José Antonio Basto)
As águas corriam da nascente que fica para as bandas dos campos arenosos, a água nasce do chão, do subsolo – dos brejais e buritizais, as águas do Mocambo descem de longe. As águas negra do rio relembra o passado de glória em que “heróis desejaram a liberdade”, lutaram em seus esconderijos nas batalhas sem registros e mais! Eram BALAIOS que sob pressão do chamado recrutamento forçado, da expressão (o pega), já desejam explodir com suas ideias e ações e fizeram isso -, numa peleja de quase quatro anos de guerras pelas matas e vilarejos. O Viajante entendera que a insurreição passara por sua terra natal “Urbano Santos” – quando o vaqueiro Raimundo Gomes arrebentara as portas da cadeia de Vila da Manga no Iguará e lançava seu manifesto começando então organizar seu exército popular que passaram por este lugar, com o intuito de armar um grupo de rebeldes em Chapadinha e atacar a Vila de Miritiba - hoje Humberto de Campos. Os fatos se construíram e se constroem a cada tempo - a HISTORIOGRAFIA faz o restante do trabalho nas linhas das memórias ancestrais e naquilo que restou de um tempo diferente repleto de lutas sangrentas, de rebeldia e da sustentação de um sonho de liberdade.
Muralhas de Santa Maria - U. Santos - (Imagem: José Antonio Basto)
O Sertão foi o espaço de luta, a terra tem um significado exemplar – presenciara muitas batalhas e demandas. A região é antiga e, sobretudo diferente. Mas toda guerra tem um fim, parava ali os combates depois que os líderes da insurreição sucumbiram, alguns se entregaram, outros preferiram morrer lutando. Os escravos sublevados pelo imperador das liberdades bem-te-vi, D. Cosme voltaram para suas fazendas... Outros procuraram quilombos distantes como o “Saco das Almas” e o “Lagoa Amarela”. Todos localizados no território deste imenso Baixo Parnaíba. Mas o medo imperava entre os sertanejos e suas famílias. Com o fim das batalhas, os legalistas ainda continuavam rondando o sertão para controlar a situação, alguns insurretos direcionaram-se ás terras de Urbano Santos, procurando refúgio seguro... Entrincheiraram-se e montaram seus barracos junto às margens do rio. Crescia as demandas de organização social, do comércio e subsistência, primeiro chamou-se “Mocambinho”, depois “Mocambo”, Ponte Nova e por fim Urbano Santos em 10 de junho de 1929. Naquela época o rio não tinha nome, daí recebera esse por ter amocambado nossos irmãos “Balaios”, mocambo é uma palavra de origem africana e significa “esconderijo” – “refúgio”. Ás “águas negras cheias de encantos”, correm banhando as comunidades que presenciaram combates; as águas que irrigam plantações frutíferas que chegam ás nossas mesas, águas que dão de beber a roças... As mesmas águas que também mata a sede de muitos da cidade. Este é o rio que inspirou o autor do hino municipal, nos trechos e linhas inscritas por José Antonio de Magalhães Monteiro: “Rio Mocambo de lutas gloriosas/ Em que heróis desejaram a liberdade [...] /Tuas façanhas são vividas 
no ideal da mocidade”.” Em tempos de outrora foi um grande rio por onde navegavam muitas embarcações transportando gêneros de nossa agricultura: (farinha, arroz, milho, tapioca, rapadura, tiquira e cachaça de cana), saindo da sede da cidade, caindo no Rio Preto ou “Rio dos Pretos”, caindo no Munim, seguindo para Cachoeira Grande e chegando à capital São Luís.
O Viajante banhava nas águas do Mocambo, observara os capítulos da história narrada oralmente pelos mais velhos. Aprendera com humildade. As memórias da guerra ainda estão vivas, resta muitas coisas boas, utensílios, barragens, cemitérios antigos, paredões, canhões... Resta o livro do pensamento que vai sendo construído ao longo dos tempos. O Viajante viajava na história deixando suas trilhas e pegadas na areia deste chão de lutas e nas águas que descem para algum lugar importante deste “Território livre”.

José Antonio Basto
E-mail: bastosandero65@gmail.com


segunda-feira, 17 de julho de 2017

Santa Rosa e o Baixo Parnaíba: camponeses organizados na luta!

Trabalhos no Seminário Agrário, Santa Rosa Bacabal - 2015
Eles se organizam ao seu modo, da maneira que podem se organizar, se não se organizam não conseguem avançar nas conquistas e nas batalhas renhidas. Há algum tempo atrás os conflitos agrários se arrastaram na comunidade Santa Rosa e Bacabal, problemas que passavam a ter mais atenção dos órgãos de defesa dos direitos humanos, mas da justiça muito pouco! Depois que acalmava a situação constrangedora, os camponeses voltaram com suas atividades na ocupação das áreas produtivas -, trabalham de roça, no extrativismo e criam seus animais para subsistência de suas famílias.
O STTR organizara um seminário agrário em 2015 para tratar de assuntos que lhes interessam como a importância da luta pela posse da terra, proteção ambiental e assistência técnica. Naquele momento se avançava os debates sobre MATOPIBA – um bicho de sete cabeças que com o aval das esferas de governos pretende colonizar o cerrado de quatro estados: Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, atingindo diversas comunidades tradicionais e passando por cima de direitos ancestrais de quilombolas, indígenas, posseiros e assentados. A Região do Baixo Parnaíba maranhense é um dos alvos desse grande projeto, pois a monocultura existente aqui, (eucalipto e soja) principalmente, representa a espoliação de terras e expulsão dos moradores das comunidades tradicionais. A comunidade Santa Rosa fica localizada no coração do Baixo Parnaíba, município de Urbano Santos, se desenvolveu entre a chapada e o Rio Preto, com área rica em terras férteis, brejais e vazantes para criação de caprinos; seus moradores enfrentaram uma peleja na defesa da terra no conflito direto - criaram uma Associação de moradores para fortalecer a luta, as desavenças na época envolveu famílias camponesas e latifundiários.
Os índices de conflitos fundiários no Baixo Parnaíba tem crescido bastante ultimamente, o mapa de conflitos registra casos em todos os municípios, mas Urbano Santos tem ficado entre os primeiros da lista. A Associação de Trabalhadores Rurais de Santa Rosa e Bacabal tem recebido parceiros de luta e dos movimentos sociais como o STTR que esteve lá nessa semana passada para fazer uma reunião com os membros da entidade. A área está em processo de desapropriação pelo INCRA, mas existe ainda uma sobra de terra do estado (chapada) que precisa ser arrecadada e incluída no futuro título. Santa Rosa é exemplo do enfrentamento direto, quando os camponeses unidos devem lutar sempre por seus direitos sociais, estes hoje negados por parte do estado democrático de direito. A terra é de quem mora e trabalha nela! Disso não se tem dúvida. Convenhamos então.


José Antonio Basto

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Um canto na chapada

Alguma coisa cantava para as bandas do leste -, a chapada estava densa e triste porque sua fauna cansada se acabava aos poucos de forma violenta. O artista pregava em seu álbum o ultimo retrato da chapada, mas onde ela ficava localizada geograficamente? Porque haveria de alguém cantar na chapada a não ser os pássaros e suas árvores “unha-de-gato” ou sapucaia ringindo uma nas outras? Na chapada se ouve muitos cantos nos recantos dos ouvidos afinados das coisas que por lá acontecem.
A chapada roncava com um sono profundo que jamais acordara. Certa vez, há milhões de anos o cerrado nascia junto aos vários fenômenos da natureza, todavia aquele tempo tudo era diferente. Existia as mesmas coisas, outras se extinguiram com o passar dos anos e das reviravoltas. A chapada que nascera ali e que foi ocasionada há milênios de anos atrás por conta das águas e do vento que continua lá com seus prantos de outrora. O canto era triste e clamava por justiça - os viventes que habitavam os lugarejos tinham um habitat vivo na comunhão da própria consciência. Um velho sábio dizia com sua voz trêmula que seu mundo de criança não era aquele que via agora - os olhos enchiam de lágrimas que corria para os rios e lagoas. O Rio que nascera por lá secou por causa da ganância, eles ainda sonham com um mundo melhor para todos e todas.
O que é uma chapada? Pode ser descrita como uma forma de relevo que possui superfícies planas, onde são comuns vales e cabeceiras de rios. Muitos são os tipos de chapadas, cada uma com suas próprias características de fauna e flora. O Viajante fala das chapadas do leste – as únicas que cantam sua própria composição, são elementos de desenvolvimento da cultura, da geografia e da educação. Conhecer uma chapada é conhecer um vasto jardim que ao mesmo tempo é um pomar natural criado pela natureza, este pomar fornece frutos silvestres, caça e água para as comunidades que em troca lhe protege do mal, do veneno e da grilagem. O chão das chapadas foram também regados de sangue de companheiros que tombaram na luta em defesa da vida e dos direitos humanos, que lutaram pela liberdade – foram eles nossos irmãos “Balaios”, nossa luta vem desde as florestas de Chico Mendes ao cerrado do Pe. Josimo – foram espelhos que refletiram novos sonhos de ver um outro mundo possível.
Muito antes de batalhas, os nativos já se orgulhavam em tirar da terra seu sustento. “A terra é de quem mora nela”, dizia um velho sábio. “O sol, a lua, as nuvens e o vento não pertencem a ninguém porque atendem todo mundo – por isso a terra é de todos nós - nela moramos, pisamos... Trabalhamos”, disse o ancião. O Viajante aprendera lições de vida, ouvia o som de uma flauta que vinha de lugares distantes, das nascentes longínquas, percebia que o eco anunciava uma nova era, mas pregava dizendo que muitos tinham que sair de suas casas para juntos construir um novo tempo sem exploradores e explorados.

José Antonio Basto


segunda-feira, 3 de julho de 2017

A AREIA DO TEMPO

Mais uma vez a saga do Viajante do leste. Por alguns dias ele desaparecera do Território mas não se esquecera de e seus rastros que estavam fincados na “Areia do tempo” e nas veredas da justiça dos direitos humanos. Contava cem anos de luta e há poucos dias os conflitos se arrastaram de lá pra cá passando às outras bandas. As mesmas pelejas de tempos remotos.
Ele atravessa o Parnaíba rumando para as chapadas do Maranhão – visitava casa a casa, tomou cafezinho com seus irmãos de batalhas e almoçara galinha caipira numa palhoça humilde junto aos companheiros. Da ultima vez que visitava as mesmas comunidades, as águas inundaram naquela época, porque a chuva corria sobre o chão do cerrado, o inverno tinha sido rígido, os fenômenos da natureza acordava a biodiversidade, pássaros e outros animais. Nas quebradas do sertão se ouvia muitas coisas, se ouvia falar, se ouvia cantar. Se ouve desde tiros a gritos de vaqueiros. Muitos sonhos rondavam os campos cheios de mistérios.
O Viajante prosseguiu falando dos muitos problemas sociais que as comunidades talvez não saibam que são vítimas dos sistemas – mas pra que falar disso? De problemas? O povo ficou por muito tempo paralisado esperando seus direitos! Esperando a reforma agrária. E nada! Quinhentos anos se passaram e as estruturas fundiárias que foram herdadas do branco europeu continuam nas mãos dos mesmos indivíduos. E os verdadeiros donos da terra, do espaço sagrado? Estes são os desprovidos de direitos que morrem a míngua a procura de saída e não acham...Vivem engaiolados e encarcerados pela violência dos desmandos do  veneno ateados em suas roças e casas, seus filhos morrem de fome porque o tatu e  a cotia que os alimentavam já não existem nas florestas. Os rios secaram e se transformaram em areia... As chapadas deram lugar à soja e eucalipto, direitos foram lesados... Alguém chorava, alguém sorria. Tudo isso aconteceu num espaço de tempo, pouco menos que meio século. Tudo foi falado, mas pouco entendido. Talvez.
O Viajante perguntava se eles acreditavam em um outro mundo possível; se tinha “esperanças de novos tempos” – responderam então se este mundo é aquele pregado e lido no cântico de comunidades que diz:

“Irá chegar um novo dia
Um novo céu, uma nova terra, um novo mar
E nesse dia os oprimidos
A uma só voz, a liberdade, irão cantar”.

Na nova terra o negro não vai ter corrente
E o nosso índio vai ser visto como gente
Na nova terra o negro, o índio e o mulato
O branco e todos vão comer no mesmo prato
[...]

Na nova terra o fraco, o pobre e o injustiçado
Serão juízes deste mundo de pecado
Na nova terra o forte, o grande e o prepotente
Irão chorar até ranger os dentes.

Irá chegar um novo dia
Um novo céu, uma nova terra, um novo mar
E nesse dia os oprimidos
A uma só voz, a liberdade, irão cantar.
[...]

O Viajante se emocionara com a letra da música “Irá chegar”, sonhava que um dia este dia vai chegar e conseguia energia para lutar com muitas forças nas longas batalhas da vida.


José Antonio Basto