terça-feira, 27 de janeiro de 2015

SOCIEDADE, ECONOMIA E CULTURA URBANO-SANTENSE. É DIA DE FARINHADA!


farinhada na comunidade Baixa Grande
A farinha de mandioca, farinha de puba ou farinha d`água e farinha seca é um derivado da matéria prima da mandioca, conhecida cientificamente por “Manihot esculenta.” A arte de fazer farinha é uma atividade centenária herdada dos nossos 

ancestrais indígenas da América Latina.

Há estudos afirmativos que a fabricação de farinha no Brasil tenha também a contribuição cultural dos Africanos que aqui trabalharam como escravos nos séculos XVI, XVII, XVII e XIX.

Mas é certo que a mandioca tenha sua origem nas terras americanas, onde explica a nota: “O nome dado ao caule do pé de mandioca é maniva, o qual, cortado em pedaços é usado no plantio. Trata-se de um arbusto que teria tido sua origem mais remota no oeste do Brasil (sudoeste da Amazônia) e que, antes da chegada dos europeus à América, já estaria disseminado, como cultivo alimentar, até a Mesoamérica (Guatemala e México). Espalhada para diversas partes do mundo, tem hoje a Nigéria (África) como seu maior produtor.

No Brasil, possui muitos nomes, usados em diferentes regiões, tais como: mandioca-brava - a que contém o veneno ácido cianídrico, aipim, castelinha, macaxeira, mandioca-doce, najazinha, branquinha, praiana, mandioca-mansa, maniva, maniveira, pão-de-pobre e variedades como aiapuã e caiabana, ou nomes que designam apenas a raiz, como caarina.”

O Município de Urbano Santos no Leste Maranhense já foi líder na fabricação de farinha. Nos anos 70, 80 e 90, saia de nossa região muitas carradas de paneiros e sacos de farinha de puba, para a venda em outras cidades do Estado e principalmente para a comercialização na Capital São Luís.

A farinha produzida no Município de Urbano Santos era conhecida nesse tempo como especial, bem amarela e sequinha. Em alguns casos os seus fabricantes adicionavam à massa manteiga e côco da praia, para dar um sabor muito mais irresistível. Muitas comunidades da zona rural viviam da produção de farinha, que tem sua fase inicial no mês de Julho indo até final de Novembro.

Para esse processo tudo começa no plantio lá na roça. Quando o lavrador ao acordar cedinho leva sua família para “plantar maniva” enquanto uns cavam o chão, outros cortam o caule da planta em pedaços de dezesseis a vinte centímetros, onde outras pessoas vão concluindo colocando-os na cova e cobrindo com pouca terra.

Depois de um determinado tempo, surgem os primeiros brotos e então nasce dali uma bela roça de mandioca (são miguel – san nunga ou roça de janeiro). Depois de um ano a mandioca está madura, no ponto da colheita. É hora de preparar os jegues com jacás (recipiente feito de talas de banbú) e xaxos (um pedaço de metal com um cabo de madeira) para arrancar a mandioca da terra.

Arranca-se as raízes da terra, levando-as até o pubeiro (local onde se coloca as raízes de molho durante três dias no rio, lagoa ou tanque feito de cimento). Passando-se esse período é o momento de “tirar a puba” as raízes já sem o leite e amolecidas são lavadas e colocadas nos jacás novamente e destinadas aos girais (espécie de suporte feito de madeira e coberto de palhas para alojar a puba). 
tapitis e roda bulandeira


Do giral a puba vai para o “banco do caititú” e em seguida a massa é triturada. Para acontecer esse processo, antigamente se usava a famosa “bulandeira” (roda de madeira) onde na maioria das vezes, dois homens com as forças dos braços, puchavam a roda que através de uma correia feita de couro cru anexada à púlia (pequeno pedaço de madeira escavado) girava a “bola do caititu” (uma espécie de ralo) parecida com o porco caititu das selvas. Nesse sentido uma mulher sentada no banco faz o manejo do ralamento perigoso da puba, a massa cai no cocho.

Depois a massa já triturada é, colocada nos “tipitis” (cestos compridos feitos de palha de buriti - tapiti), a massa é escorrida e depositada na gamela para ser peneirada, usa-se uma peneira feita de talas de tabocas, guarimã ou buriti para essa prática. A massa peneirada é enviada para o forno, que já está muito aquecido e ensebado com sebo de gado ou azeite de babaçú, para não grudar a massa no metal ou cobre.

Os primeiros momentos chama-se “passar a massa” depois da massa passada no vai-e-vem do rôdo, ela é recolocada em outro forno para o ponto final, conhecido como “secar a farinha” (apuramento da farinha). Passado esse momento a farinha torrada é depositada nas gamelas para o esfriamento e depois de fria, segue-se para o empaneiramento, botar a farinha nos côfos de palha de babaçú.

Os lavradores tem o costume de fabricar os côfos artesanalmente (cestos de palha de babaçu ou palmeira najá) e colher folhas de axixá, guarimã ou bananeiras. Os paneiros são forrados com as folhas para o alojamento da farinha.  Portanto chega-se ao fim da farinhada. Os lavradores vendem a farinha para resolverem seus negócios.  Nos anos oitenta e noventa em Urbano Santos era muito comum os camponeses se preparar para a farinhada com o intuito de vendê-la para conseguir algum dinheiro e passar o “FESTEJO DA NATIVIDADE” de 1º a 7 de Setembro. Essa tradição é mantida até os dias de hoje em nossa cultura.

Urbano Santos foi grande campeão de fabricação de farinha. Isso deve ser reconhecido, pois as gerações contemporâneas e futuras podem tomar conhecimento desse maravilhoso processo que contribui para o avanço do nosso município tanto na questão socioeconômica, cultural e social, perpetuando-se de gerações para gerações. “Farinhada é motivo de alegria, força de trabalho rural, cultura e desenvolvimento sustentável e solidário.” Viva a farinhada de Urbano Santos.


José Antonio Basto
Poeta e pesquisador
(98) 98890-4162
bastosandero65@gmail.com

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Agronegócio X PADRSS na Região do Baixo Parnaíba Maranhense


BAIXO PARNAIBA-MA
Campo de eucalipto da Suzano - Baixo Parnaiba
Recordei-me de uma certa vez quando estava lendo a revista da ENFOC (Escola Nacional de Formação da CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), onde a mesma tratava da grande diferença entre as políticas do Agronegócio e PADRSS – “Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário”, então refleti sobre essa questão no TERRITÓRIO DO BAIXO PARNAIBA MARANHENSE, onde existe uma enorme disputa de terras entre o sistema atrasado da monocultura do eucalipto e soja e o Desenvolvimento Rural Sustentável na Agricultura Familiar. Vejamos então os dois pontos contrários.
Menino quebrando bacuri - Pov. São Raimundo / B. P
Farinhada - Baixo Parnaiba
 O agronegócio é um modelo produtivo agroexportador, resultado de uma aliança entre o grande capital, representado pela agricultura patronal, com setores financeiros, industriais e com o estado. Este modelo contém uma concepção ideológica de desenvolvimento para o campo com concentração de terra e de renda e sem gente. Investe na mercantilização dos bens naturais como terra, água e biodiversidade, construindo dependência por pacotes tecnológicos, insumos químicos, agrotóxicos, sementes transgênicas e maquinários que devastam os recursos naturais e a saúde humana”. Já o PADRSS é o nosso “Projeto Político do Movimento Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais para o desenvolvimento do campo, cuja centralidade é: realização de uma REFORMA AGRÁRIA AMPLA, massiva, forte e de qualidade para as populações tradicionais, fortalecimento e valorização da agricultura familiar COM GENTE, promoção da soberania e segurança alimenta, trabalho e dignidade no campo. Este projeto contém uma concepção ideológica de desenvolvimento do campo baseada na garantia da igualdade e do respeito entre os povos e na transição para o modelo produtivo agroecológico e orgânico. Investe ainda na luta por políticas públicas sociais necessárias ao pleno desenvolvimento humano e na superação dos históricos problemas estruturais de reprodução da vida no campo, nas águas e nas floresta”. Com isso podemos perceber que a realidade no Baixo Parnaíba Maranhense, sendo este um território marcado por conflitos agrários e socioambientais não pode ser diferente de outros lugares do país. Pois aqui em nossa região das chapadas, as políticas dos monocultivos vieram para transformar o meio ambiente, assim deixando um legado de devastação das espécies vegetais e animais, destruindo cabeceiras de rios, riachos e lagoas que dantes nunca viram tão mudanças drásticas.
Quebradeira de côco babaçú - Baixo Parnaiba
A ganancia do agronegócio se espalha pelo Maranhão e resto do Brasil privatizando cada vez mais os bens naturais: terra, água e biodiversidade.  É triste saber que 80% dos recursos federais anualmente sustentam a monocultura em nosso país, sendo apenas 16% para a agricultura familiar e com muita dificuldade para os camponeses acessarem créditos de apenas quatro mil reais pelos PRONAFs. A Reforma Agrária real é caminho para todos nós adquirir liberdade, as comunidades não lutam apenas pela desapropriação e /ou regularização, mas clamam por desenvolvimento técnico podendo assim produzir e até exportar os produtos que dão vida.
Acredito que somente com a união dos povos camponeses poderemos dá uma resposta a este modelo predatório, atrasado e sem futuro para a humanidade que é o AGRONEGÓCIO CAPITALISTA. juntos criaremos as condições para ampliação e fortalecimento das práticas ensinadas pelos nossos pais e avós, fazendo valer a vida, os direitos humanos, a biodiversidade e a natureza.

(José Antonio Basto)
 M. D. H. V – B. P. M)

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

CHAPADA DO MEIO, URBANO SANTOS - BAIXO PARNAIBA


Quando eu era menino caçava murici vermelho na “chapada do meio” -, próxima a sede de Urbano Santos, no baixo Parnaíba. A chapada escorrega suas fronteiras e limita com os povoados Porto Velho I e II, Escuta e Riacho Seco. Pássaros como cacurutas, pipira-preta e bem-te-vis da mata alegravam o imenso campo repleto ainda de bacuris, pequis e pitomba de leite. Por lá se encontra um cemitério antigo que concentra os restos mortais de pessoas que moravam nas redondezas e sobreviviam da caça e do extrativismo.
A chapada do meio já está possivelmente visada por grupos de gaúchos que estão nas proximidades plantando soja e assassinando animais nas comunidades. Os povoados citados pertencem a pequenos lavradores que herdaram de seus familiares que não venderam suas terras para o agronegócio destruir. O gado pasta livremente comendo o capim e juquira dando vez para carcarás catar os carrapatos em suas costas. Agora poucos dias atrás bateu uma saudade de visitar a chapada e fazer algumas fotos da paisagem. Saí cedinho de casa neste domingo passado, 11/01, para visitá-la, muita coisa mudou, percebe-se como em quase todas as chapadas o problema do fogo que a vaqueirada ateia na pastagem para novos brotos. Sai pelas veredas velhas que só restam rastros de porco e gado, “desci pela grota que desemboca nos currais antigos dos tabocais” e voltei para casa novamente pela mesma trilha. Os campos estão diferentes mas intactos como antes, desconfiança, talvez! Parte da chapada do meio foi cercada ainda na década de 80 pela Empresa Florestal LTDA, no mesmo período em que sua sede foi instalada. O campo grande de futebol que ficava no inicio, hoje já faz parte do Bairro São José pelo avanço das mudanças estruturais das famílias que construíram suas casas vindo do interior. A chapada do meio precisa de proteção, não apenas ela, mas todo nosso bioma cerrado do Baixo Parnaíba Maranhense. A Suzano e os gaúchos vieram para mudar nossas tradições e nosso modo de produção como agricultores familiares, mas eles não são daqui e sabemos trabalhar com consciência, essas terras já tem donos -, os camponeses que vivem há séculos tiram seus sustentos, criando... recriando e protegendo com respeito. Nasce na chapada do meio a cabeceira do “riacho braço do boa hora” -, que infelizmente  já secou há muito tempo possivelmente causado pela devastação do bioma e plantio de monocultivos. Precisa-se dá um basta nessa questão, não nos alimentamos de soja nem de eucalipto, muito menos de veneno e agrotóxicos; ingerimos alimentos da agricultura familiar para nossa saúde como arroz, feijão, farinha, abóbora, melancia e fava. Os trabalhadores rurais lutam ainda pelo tão sonhado “PROJETO ALTERNATIVO DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL”, para assim poder desenvolver a Reforma Agrária e a nossa luta em defesa dos direitos humanos e da vida no BAIXO PARNAIBA.
Os encontros e desencontros da chapada do meio nos faz refletir sobre a carência de projetos alternativos de proteção do meio ambiente em nossa região e a luta da natureza em meio à grande problemática do impacto ambiental e transformações das populações tradicionais. Muitos jovens no futuro talvez não verão as belezas de nossas chapadas, isso não é baixo-astral, nem mesmo pessimismo... mas é a realidade em que estamos vivendo no momento, no real. Queremos a chapada em pé e não cortada de motor-serra e queimada pelo fogo do capitalismo neoliberal! Que um outro mundo seja possível, se a humanidade conscientizar-se que ela mesma está se destruindo. Viva a chapada do meio como todas as chapadas! Esse pedaço do mundo em Urbano Santos, no leste maranhense.

 (JOSÉ ANTONIO BASTO)
-Militante dos Direitos Humanos / Baixo Parnaíba-MA.
(email: bastosandero65@gmailcom)
(98) 98890-4162

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Menino quebrando bacuri na comunidade tradicional de São Raimundo, Baixo Parnaíba maranhense.


menino quebrando o bacuri
O Povoado São Raimundo localizado no município de Urbano Santos, Baixo Parnaíba maranhense está entre as comunidades modelo no que se diz respeito à proteção das chapadas, sendo esta a grande mãe responsável por parte do sistema socioeconómico daquela gente. Uma consciência ecológica que fez com que a associação tomasse algumas medidas cabíveis combatendo então a derrubada do bacuri verde e, sobretudo a proteção do cerrado por inteiro. A Francisca, presidente da entidade elaborou abaixo assinado e denúncias junto aos órgãos competentes com o intuito de barrar tanto a extração do fruto verde quanto a devastação da chapada pelo motor-serra de muitos oportunistas que entram ilegalmente na área demarcada, pois o estrago do bacuri verde é uma grande perda para a própria população, os moradores devem conscientizar-se que a colheita serve para todos e nunca com o sentimento de ganancia individual. São Raimundo tem muito a ganhar com essa luta. A questão cultural da extração do bacuri no São Raimundo nos faz voltar a um período bem remoto e lembrar quando as famílias saiam para os campos (chapadas) com seus cofos e jacás colher os amarelinhos. Ao falar em cultura familiar das comunidades tradicionais, tocamos em um assunto importante e até polêmico, uma criança do interior muitas das vezes acompanha os pais em seus afazeres, como ir para a roça, pescar e caçar entre outros ofícios que passam de pai para filho, então não se confunde trabalho de economia familiar com trabalho infantil. Em São Raimundo, assim como em muitas outras comunidades, os bacuris são quebrados e tirado a poupa num trabalho coletivo da família do mais velho ao mais novo, podendo assim os mais jovens aprender as tarefas com os mais experientes. São Raimundo espera por uma desapropriação fundiária com o intuito das famílias serem assentadas e estabelecer-se a partir de então a tão sonhada reserva sócio extrativista.

José Antonio Basto