domingo, 1 de outubro de 2017

Anoiteceu em Baixa do Cocal

Quando se viaja pelas comunidades rurais do município de Urbano Santos, Baixo Parnaíba maranhense, se percebe diferenças nos caminhos que dantes eram estradas tradicionais; caminhos e veredas donde os camponeses trafegavam com suas cargas de palha, mandioca, materiais da lavoura... Enfim, coisas que só as comunidades tradicionais sabem fazer. Estes mesmos caminhos e veredas foram transformados e aplainados pelos plantios de eucaliptos e soja das empresas que por estas bandas estão implantados seus negócios. O agronegócio que nada representa para os homens e mulheres do campo – um programa capitalista que usa e abusa da terra gerando lucros individuais – deixando, portanto, um legado de destruição da natureza, com a expulsão das espécies animais e naturais da região... Transformando os modos de vida dos povos tradicionais.
A terra das comunidades de Baixa do Cocal I e II – são terras devolutas do estado – uma média de 800 hectares, áreas que foram ocupadas por retirantes do Ceará e Piauí  nas primeiras décadas do século XX, assim como muitos outros povoados da Região do Baixo Parnaíba. A convite de amigos companheiros de luta, participei de uma reunião de criação da Associação de Trabalhadores Rurais –, sabe-se que a organização é o passo fundamental de uma entidade e mais ainda quando se trata da terra. As comunidades vizinhas da Baixa do Cocal como a Mangabeirinha, Santana e Ingá também são impactadas pela monocultura – essas e outras comunidades aguardam a vinda do ITERMA para o sistema de arrecadação. Mas além desse problema os moradores têm intrigas entre si – coisas que não deveria acontecer, apesar de ser normal. Lutar pela terra e por direitos requer união das pessoas, uma vez que os frutos da terra são distribuídos para todos e todas. A compreensão no meio camponês é algo desafiador – resolver e /ou pelo menos aquietar ânimos entre vizinhos não é uma tarefa fácil para um militante ou Sindicato, mas fácil é jogar seus ideais com respeito e provas contra os sistemas no desejo de uma vida melhor para os menos favorecidos e desprovidos de direitos.
Passava-se o dia todo por lá, voltaria a tarde – mas o almoço de galinha caipira não deixara vir cedo. O sol ardente, em meio a chapada – começava-se a reunião de demarcação e catalogação das áreas ditadas pelos posseiros. Documentos foram apresentados, mas as verdadeiras certidões estavam ali presentes. “Os próprios camponeses”. Que ali moram, trabalham, se reproduzem socialmente e culturalmente há décadas... Séculos. Eles sabem onde pisam, onde fazem suas roças, conhecem muito bem as áreas de caça e boladas de bacuris que colhem no tempo certo. Se mantém na resistência de seus afazeres tradicionais. A tarde vinha e a preocupação de trilhar as chapadas crescia, pois, os envios caminhos se perderiam a não ser pela velha estrada de sempre. Os assuntos que só interessam a eles foram resolvidos e acordados com o intuito de manter o desenvolvimento e sobretudo o crescimento coletivo de produção e organização.
Raramente se encontra comunidade hoje em dia sem energia elétrica, graças ao “Programa Luz para Todos”, mas por mera consciência do destino a energia faltava naquele final de tarde e aí era a vez das velhas lamparinas. O Viajante foi convencido de ficar mais tempo – pois ali, após a finalização de um longo dia de trabalho saia muitas histórias dos mais antigos, como era a região há 50 anos atrás – as farturas de alimentos e de água que não se ver mais agora. O cheiro das panelas que cozinhava o restante da galinha para o jantar adentrava pela sala onde estava a roda de conversa sob a luz das lamparinas. Passava-se o tempo sem ninguém perceber, quando “Anoiteceu em Baixa do Cocal”. Restava então o fim da conversa, o jantar e a apreciação da lua com seu espetáculo no coração do Baixo Parnaíba.

José Antonio Basto
E-mail:  bastosandero65@gmail.com      





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