O “Viajante do Leste” dessa vez saia da cidade de Urbano Santos
passando pelas comunidades entre São Benedito do Rio Preto, seguindo para as
Placas e de lá para Chapadinha. Lembrara-se de tantas coisas – mas o que
inundava seu imaginar sobre a vista dos babaçuais e do sertão de arvores tortas
era na verdade a “saga história dos balaios” que por lá andaram há 179 anos
atrás. Da janela da caminhonete avistava-se algumas palmeiras de carnaúba e a
sequidão daquela caatinga, um bioma interessante e, sobretudo incrível para
quem admira a natureza e as relações sociais das comunidades rurais do Baixo
Parnaíba maranhense. A Balaiada começava a circular o pensamento do repórter numa
retrospectiva de tempos de outrora.
O estopim do movimento que mais tarde se chamaria “Balaiada” foi
ali – em Vila da Manga – (hoje Nina Rodrigues), naquele momento em que os
“vaqueiros bem-te-vis” liderados por Raimundo Gomes “O Cara Preta” invadiram a
cadeia – era o dia 13 de dezembro de 1838 –, acreditava-se que os frutos da
insatisfação do povo pobre do sertão maranhense: vaqueiros, artesãos, índios,
caboclos, camponeses e escravos -, esta sublevação se firmava. Pois muita coisa
já tinha acontecido e vinha acontecendo como o grande problema da “Lei dos
prefeitos e subprefeitos” –, política responsável pelo recrutamento forçado – “O pega”
e, sobretudo a questão dos desmandos, conflitos fundiários dos camponeses menos
favorecidos e desprovidos de direitos que lutavam contra a tirania dos grandes
fazendeiros da região nordeste do Maranhão – sendo estes os que herdaram as
estruturas agrárias e governamentais dos colonizadores (portugueses). Raimundo
Gomes lançara seu famoso “Manifesto da Manga”, onde ali estabelecia suas ideias
de liberdade e administração política numa província em que os lusitanos mandavam
chover. Da Manga do Iguará seguiram sua rota para Vargem Grande, Itapecuru,
voltando para Chapadinha, Brejo, São Bernado, Tutóia, Miritiba, Icatú –, com um
grande grupo formado no decorrer deste percurso – pensaram então em atacar a
Ilha de São Luís, capital da província, mas se acharam inferior em relação à potencia bélica do governo do Maranhão na época. Voltaram para Brejo onde
montaram o quartel general, depois disso Raimundo Gomes se junta com o Balaio
Francisco Manoel dos Anjos – (o fabricante de cestos do Povoado Pau de Estopa -
município de Coroatá), que vendia seus produtos nas feiras da região para
sustentar sua humilde família que fora ofendida pelos legalistas, daí a razão
de entrar na luta e se tornar um dos chefes mais importantes. O Balaio daria o nome à insurreição. O exercito popular de
“nossa guerrilha camponesa” crescia a cada momento, os Bem-te-vis (liberais),
deram apoio aos insurretos, pois eram oposição aos Cabanos (conservadores). Os
Balaios do Maranhão se juntaram aos revoltosos do Piauí – quando Raimundo Gomes e seu
grupo ocupara a cidade de Campo Maior-PI, retornaram em grande massa atravessando
o Rio Parnaíba e se organizaram para atacar a cidade de Caxias. E fizeram em
1839. Entraram naquela que era a cidade mais importante da província, depois de
São Luís. Ali organizaram uma junta governativa provisória. O governo
maranhense naquela ocasião, preocupado da rebelião atingir outras regiões e até
outras províncias do sul organizou suas forças militares, inclusive com apoio
de soldados de outras províncias, e passou a combater fortemente os balaios.
Com a participação de muitos escravos fugitivos, prisioneiros e trabalhadores pobres
da região, os balaios conseguiram obter algumas vitórias no início dos
conflitos. Foi daí então que o Coronel Luís Alves Lima e Silva foi nomeado pelo
Império como Governador da Província do Maranhão com o objetivo de pacificar a
revolta, pelo menos no nome. O Barão de Caxias, que mais tarde seria duque, foi
quem sufocou os valentes rebeldes – nomenclatura que se tornaria seu título
dado pela nobreza por ter assassinado os que abriram uma das portas mais
importantes da história para a liberdade dos povos oprimidos. Francisco Manoel dos Anjos morreu na
perda da Vila de Caxias e Raimundo Gomes infelizmente com a promessa enganosa
de anistia pelos atos se entregou às tropas oficiais da legalidade. Daí um
outro personagem entra em cena: Cosme Bento das Chagas – “Tutor e Imperador da
Liberdade”, este assumiu a liderança dos balaios. Em 1840 ele partiu, com
centenas de revoltosos para o interior. Em 1841, já com o movimento
enfraquecido, muitos balaios resolverem se render, aproveitando a anistia
concedida pelo governo. Em 1842, o líder Cosme Bento das Chagas foi capturado e
enforcado em Itapecuru Mirim. Era o fim da revolta.
Toda essa história se passava pela cabeça do Viajante que trafegava
por alguns trechos da velha estrada dos Balaios. A terra de “Barro Vermelho”
que se tornara sagrada para os quilombolas descendentes de Negro Cosme; os
vaqueiros daqueles povoados descendentes de Raimundo Gomes e os artesãos da
região filhos de Francisco dos Anjos, além dos índios que ainda herdam a alma
do líder “Índio Matroá” – são estes os nossos heróis. A insurreição popular que se
diferiu de todas as outras do período regencial do Brasil, hoje merece um canto
especial e destaque na história dos povos que lutam e acreditam na liberdade.
Era isso que passava na mente do “Viajante do Leste”, que faz do sertão,
da terra, da reforma agrária, das chapadas, da culinária camponesa e das coisas
mais simples da vida através de vocábulos sua verdadeira identidade
memorialista.
José Antonio Basto
E-mail: bastosandero65@gmail.com
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