terça-feira, 13 de outubro de 2015

Chapadas e cabeceiras de rios: o que há de incomum?


        Sai convicto de que aquela palestra para professores, alunos e membros da Comunidade Mangabeirinha seria interessante em passar meu conhecimento e ao mesmo tempo aprender com os mais jovens e também com os mais velhos a respeito de um tema que já venho militando há algum tempo. Em nome do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Urbano Santos aceitei o modesto desafio da professora Lisa quando me convidava para falar de meio ambiente em nosso município. Então pensei que não tinha como explanar essas questões ambientais nesta região sem tocar no grande e maior problema que é a do eucalipto - principalmente quando se tratava daqueles polos comunitários: Mangabeirinha, Lagoa dos Costa e Bom Fim, povoados esses que são atingidos diretamente pelo impacto ecológico da monocultura.

        O Projeto Pedagógico “Água é vida” coordenado pelos professores, alunos e alguns membros da comunidade, tende trabalhar na íntegra a preservação e o salvamento do Riacho Mangabeirinha que infelizmente já está quase no fim de sua vida. Mas para isso precisavam de uma noção básica geral sobre a escassez da água em nossa região, o porquê do desaparecimento desse recurso precioso. Foi daí então que lancei as perguntas iniciais relacionadas à preservação das chapadas, sendo as chapadas mães da cabeceiras dos rios, riachos e lagoas na Região do Baixo Parnaíba. O que chapadas e cabeceiras têm incomum? Explicava-se que todas as nascentes dos rios do Baixo Parnaíba estão localizadas nas chapadas onde parte dessas chapadas foram invadidas pelo eucalipto da Empresa Suzano Papel e Celulose, nesse sentido exemplificava-se portanto o caso do próprio Rio Mangabeirinha - onde nas palavras do Zé Crispinho – aquele militante do movimento social dizia que sua nascente está dilacerada, além do sugamento de água pelos eucaliptos, houve uma época em que os caminhões-pipa do agronegócio extraiam ilegalmente suas águas da cabeceira localizada numa região de buritizais ente o brejal e a chapada. A prática da extração ilegal de água é comum em muitas comunidades como também a extração de areia e piçarras. O Raimundo Preto, também liderança da luta pela terra que ainda se encontra em questão, acentuava que no tempo de seus pais ouvia historias da presença de muitos animais que moravam e reproduziam nas chapadas como ema, anta, seriema e nambu fi-fiu... espécies raras ameaçadas de extinção. Interviam com clareza e responsabilidade de falar que alcançaram esses rios todos cheios no período do inverno... com muita fartura de peixe e buriti pra colher no tempo da safra. Hoje o que restou disso tudo? O legado da destruição ecológica desenfreada e sem controle do grande capital que nada fazem para o meio ambiente, pensando sempre em mais lucros e lucros. Aproveitando as imagens do slide comparando o agronegócio versus PADRSS, observava-se a enorme diferença entre uma cultura e outra: os danos do agronegócio e o bem da biodiversidade com produção agroecológica de forma equilibrada. Dona Luzia colhedora de bacuri nas chapadas da Mangabeirinha desabafava dizendo que um dos graves problemas de quem sabe um possível desaparecimento dos bacurizais é os eucaliptos e a soja, mas que muitas pessoas não têm consciência dos fatos e acabam cometendo infração como é o caso da derrubada do fruto verde. Os olhares atentos dos alunos nas imagens do slide que mostravam a devastação das chapadas e a importância dos recursos hídricos no município de Urbano Santos, me deixaram a falar a vontade e sobretudo desabafar a respeito dos desacatos e violações de direitos humanos. Comparações entre os campos de eucalipto com a produção de farinha no Povoado Baixa Grade; tratares com seus correntões e uma lavadeira de roupa da comunidade Santa Maria... cerrado e agronegócio -, diferença entre o programa capitalista dos monocultivos e o PADRSS... foram assuntos, provocações e desafios para os ouvintes que talvez viram esse debate local pela primeira vez.

         Os trabalhos foram encerrados com os depoimentos de D. Maria -, uma antiga moradora, frisava que na época em que era criança a região da Mangabeirinha era tudo diferente, tinha muita água, terra, bacuris, chapadas, caça, peixe e o respeito uns com os outros imperava entre as pessoas. O eucalipto veio para acabar com as matas, as água, as cabeceiras e a vida; disse ela. Percebi que a palestra teve proveito e que todos saíram com uma consciência formada a partir daquela atividade.

José Antonio Basto
Militante dos Direitos Humanos
email: bastosandero65@gmail.com
(98) 98607-6807

 

 

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