quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

A mulher que caça

Tereza caçando com seu cachorro
                                                                                

Eu só conheço uma mulher que exerce o ofício de caçadora, ela é camponesa, mas gosta mais de caçar do que trabalhar na roça. Mas caçar para alimentação é uma tarefa culturalmente masculina regida desde tempos bem remotos na história das civilizações. O ofício de caçar para se alimentar é pré-histórico. As técnicas e tradições são repassadas de pais para filhos, no mesmo clã, na mesma família ou comunidade.

A Tereza, moradora na Comunidade Sítio do Meio, na Região do Baixo Parnaíba é essa personagem – uma figura extrovertida, dinâmica e interessante. Há muito tempo conheço a Tereza, desde as épocas dos encontros de comunidades e organizações das CEBs na região. A Comunidade em que ela caça é as Pedras, fica entre as chapadas do Sítio do Meio e Joaninha, seus moradores resistem as ameaças dos gaúchos que adentraram suas áreas – o espaço onde caçam para sobrevivência foi tomado por eucalipto, cercado para mais tarde dá espaço a soja. O riacho joaninha que nasce nas pedras também é ameaçado e sofre com a seca no período do verão, vítima do impacto direto da monocultura agressiva que invadiu o território.

A Tereza sabe desses problemas que maltratam sua comunidade, em suas caçadas de cachorro para pegar cotia, pensa nos problemas que seus filhos e netos um dia terão que enfrentar. A caça que alimenta sua família está ficando pouca, boa parte das chapadas que ficaram para sua família já foi vendida e/ou grilada. As terras das comunidades vizinhas também foram tomadas. O cerrado que se arrasta até as fronteiras do município de Barreirinhas já não é o mesmo. Barreirinhas tem leis próprias que proíbem o desmatamento do cerrado para o plantio de monocultivos -, acha-se que as caças que vivem nas áreas das chapadas e matas das Pedras e Sítio do Meio seja talvez as mesmas que se procriam nas comunidades de Barreirinhas.

A Tereza agradece seus filhos que lhe ajudam nessa tarefa, tanto na caça quanto na roça. Ela tem consciência que suas caçadas não agridem o meio ambiente, além disso ela protege as matas aos redores de sua casa e muito além de seu terreiro. A Tereza tem descendência de índios, talvez os Tremembés que habitaram nossa região há alguns séculos atrás. Boa parte dos moradores das Pedras e Sítio do Meio se parecem com indígenas – muitos deles nem sabem de sua história, os mais velhos contam passagem da vida dos índios. Permanecem com seus hábitos nativos de procriação, cultura agrícola, caça e pesca. As comunidades tradicionais e seus modos de vida merecem respeito dos órgãos competentes, os conflitos por terra e por água tem crescido bastante nesta região e em todo estado. Os trabalhadores rurais assim como a Tereza são os agentes de defesa da natureza e das praticas tradicionais que lhes ajudam nos meios de resistência e sobrevivência.

A Tereza caça porque gosta de caçar, seus pais lhe ensinaram o valor da vida e o respeito com o meio ambiente, ela repassa isso para seus filhos e netos. Os animais silvestres que ajudam na alimentação da família da Tereza estão migrando a procura de lugar seguro. A caça de subsistência é uma atividade comum das formas de atividades no dia-a-dia das comunidades tradicionais.

 José Antonio Basto


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