terça-feira, 3 de novembro de 2015

A CHAPADA E O VENTO LESTE


Ela chorava quando o vento batia em seus bacurizeiros, quando o vento se ia e logo vinha a noite calma e densa; ela chorava quando lembrara da fronteira da soja e do eucalipto selvagem que através do veneno perigoso já secara todas as suas poucas nascentes. Ela chorava quando de repente se lembrava que mora agora dentro do agronegócio. O vento leste cortava o pedaço do mundo em direção aos portais do Parque dos Lençóis, desembocando no horizonte do mar tenebroso. Ela estava ali cansada desde tempos bem remotos – algumas décadas de pura solidão aparavam suas lágrimas; as épocas românticas já não se falam mais; os tempos de fartura, tampouco. Ironia do destino ou ignorância da raça humana? O dinheiro que talvez certos dias comprassem tudo, hoje não compra nada... porque o bem mais precioso das chapadas que são as cabeceiras dos rios e riachos elas desapareceram totalmente vítima do grande impacto ecológico e social. Muitas coisas mudaram de curso, as águas mudaram seu curso, o consumismo atingiu seu apogeu e os viventes pensantes não guardam consigo se quer uma gota de consciência. O vento soprava para o Baixo Parnaíba e anunciava uma era futura de sonhos com o revestimento das espécies vegetais e o reaparecimento dos animais das matas. Aquele vento leste trazia sobre as brumas e as nuvens as canções de comunidades que não se mais ouvia... os batuques, os toques, os tiros no sertão e os tambores num gingado de história e resistência armada. São nas chapadas que estão os restos mortais dos vultos líderes que deram inicio a essa guerra em que todos estão envolvidos na atualidade. Os tiros e morteiros que atravessaram séculos e séculos estão adormecidos no mesmo barro amarelo... na mesma terra regada de sangue dos mártires com sede e esperança de justiça.

José Antonio Basto

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