José Antonio Basto
# PROSA POÉTICA SOCIOAMBIENTAL, ENSAIOS, QUESTÕES AGRÁRIAS NA REGIÃO DO BAIXO PARNAÍBA MARANHENSE E DIREITOS HUMANOS.
quarta-feira, 8 de julho de 2020
A panela preta
Na
hora da foto ela ficara com vergonha de sua famosa "panela preta" ser
vista por outras pessoas, além da gente que é acostumada em sua casa. E ainda
mais, quando se trata de postagens na internet que mais tarde pode virar
domínio público. Explicava então que tomaria todos os cuidados necessários caso
permitisse a publicação do texto e da imagem da panela, pois muita gente gosta
de ler e apreciar as tradições e coisas da roça. Mas ela não sabia da
importância de se possuir uma [panela preta] daquelas que tem seus mais de meio
século de existência, pertencera sua avó, depois seus pais, ultrapassara as
barreiras do tempo até a terceira geração. Panela de ferro no fogo de lenha, o
tempo lhe deixara preta pelo excesso de fumaça das "trempes de
pedras" - (três grandes pedras que servem de fogão). Pensara-se numa
prosa, quando o Viajante voltasse de seu ofício. Há dias não caminhara por
aquelas bandas. Resolveu então mudar o trajeto da viagem, saíra do leste e fora
para o oeste. Regiões diferentes pelo clima e pelas vistas, matas e
florestas... lagoas e alagadiços... opostos, com situações socioambientais
incomuns. O objetivo da escrita não era aquele, os desafios fazem parte da vida
humana desde a criação do homem; mas as vezes é preciso falar de novas
esperanças para um mundo novo - mesmo que esse pensamento seja utópico ou venha
cair num romantismo. A prosa se ensaia em direção às vivências dos povos
tradicionais, sua cultura e tradições que alimentam a vida, seus problemas
agrários, as belezas naturais numa dose de poetização sociocultural e socioambiental.
O Viajante abancara ali naquela moradia, seus anfitriões o convidara para
degustar um prato de "quibebe de abobora", feito na velha panela de
ferro. [Quibebe é um prato de origem africana, típico da culinária brasileira
preparado principalmente nos quilombos rurais e comunidades tradicionais da
Região Nordeste. É um purê de abóbora que acompanha, geralmente, carne, frango,
camarão ou peixe. A palavra "quibebe" é um termo originário da língua
(“quimbundo kibêbe” -, que significa angu ou massa de tubérculos, mandioca,
abóbora, batata...etc...). Esta língua ainda é falada em algumas regiões da
África Oriental. Chegou ao Brasil com os negros que foram escravizados. Um dedo
de prosa! Enquanto os pratos esfriavam na mesa. Falava-se nas roças de verão,
na produção e preços da farinha de puba que teve suas elevações pelos fenômenos
anteriores. A hora era chegada, ouvia-se o chamado, a carne e o peixe seco
estavam na brasa... chiando... acompanhariam o quibebe, o cheiro era bom. Cedo
da manhã, uma dose de energia certa após uma "pratada"- de mingau de
abóbora com leite de coco babaçu e carne assada. Lembrava-se dos tempos antigos
quando tudo era diferente nas comunidades rurais do interior; quando os mais
velhos se alimentavam bem com produtos naturais e orgânicos; viviam longo tempo
porque sabiam disso. Alguns modos de vida foram caindo no esquecimento ao longo
das décadas, infelizmente, uma perda para a cultura. Deve-se manter o que ainda
restou. E a panela preta? Uma foto apenas com o purê de abóbora que estava ao
fundo. Ela não sabia da repercussão e valorização dos que visualizaram a imagem
da panela e do quibebe! A famosa panela que também torra café de coco, esquenta
a água para pelar leitão, cozinha peixe ao leite de coco e arroz na palha de
banana. Incrível suas utilidades... orgulho de sua dona. Após a merenda
extraordinária o Viajante seguira rumo aos campos arenosos em busca de novas
aventuras e conteúdos para seus pedaços de prosa. Ele voltaria para mostrar aquela Senhora a curta, simples e modesta matéria,
fruto do seu talento e manutenção dos modos de vida dos povos que moram,
trabalham e vivem nas comunidades tradicionais.
José Antonio Basto
José Antonio Basto
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Lendo o texto me reportei a minha infancia em Colinas e boas lembranças da panela que fazia o melhor "pregado de maria izabel"...
ResponderExcluirLendo o texto me reportei a minha infancia em Colinas e boas lembranças da panela que fazia o melhor "pregado de maria izabel"...
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