segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Era aquele tempo de rastros e tiros nas chapadas do Baixo Parnaíba


Foi um certo tempo, uma época de guerras pelo sertão – levantes e insurreições dos balaios que no Baixo Paraíba ainda não viam a febre do eucalipto, exceto os tiros dos fuzis legalistas imperiais que disparavam contra os quilombolas e caboclos. Até então eles eram negros irmãos dos Quilombos de Bom Sucesso e Saco das Almas. Naquele tempo os monocultivos não atrapalhavam a vida das comunidades – mas entrelaçavam-se pelo futuro, atrapalhava-se no dia-a-dia  e no medo de morrer furado de balas pelo simples fato de lutar por direitos e pela já então debatida Reforma Agrária. Neste território já existia comunidades tradicionais desde de séculos atrás que adentravam pelas matas de bacuris deixando seus rastros pelos envios caminhos dos barros vermelhos das chapadas do Baixo Parnaíba, território de disputas fundiárias, de outrora aos dias de hoje. Essas disputas que continuam. Ainda ouve-se aos nossos dias os velhos tiros, os caçadores que procuram a cotia, a paca, o veado, o jacú e a nambu indgnam-se porque não encontram mais –, não acham água nas cabeceiras porque o eucalipto e a soja engoliu tudo. Que desgraça essa meu Deus! Esta infâmia do agronegócio... do capitalismo selvagem e violento, aqueles correntões devastaram tudo... não sobrou pedra sobre pedra. Como pode tamanho desacato! Meus avós e tios-avôs contavam-me que ontem tudo era muito diferente: existia muitos animais, água, rios, lagoas, brejos, frutos nas matas... as pessoas viviam em paz sem arrogância e sem ganância. Os campos e chapadas eram livres para o mundo, paras as pessoas morarem e reproduzirem-se. Um tempo romântico que não volta mais no Território do Baixo Parnaíba Maranhense -, um pedaço do mundo que precisa ser reformado sobre a pena de alguém ou por ações governamentais. As comunidades que habitam aqui devem entender que são libertas de tudo... das algemas que os prende na política de compra e venda. Essas comunidades trabalham e vivem desde de tempos bem remotos na resistência praticando seus ofícios extrativistas e trabalhando na lavoura. Os esconderijos do mocambo são quarteis de hoje que clamam por justiça social e concretização de direitos humanos. Precisamos das chapadas para manter a chuva, para assegurar os rios na piracema. Os buritis dos brejos estão lá solitários aguardando visitas nem que seja dos papagaios do “furo dos espinhos” -, um final de tarde cansativo e decisivo para aqueles momentos de dores e desprezos em suas gargalhadas sarcásticas. Ouvia-se um cântico de araras e jandaias que circulavam as beiras das chapadas avisando algo de errado maliciando um novo tempo de fumaças ferozes. A região agrária agora fala mais alto do que nunca, do que os mais velhos na sabedoria da vida em coletividade. A pistolagem, a ameaça... o verbo e a coragem de escrever toma conta dos ouvidos que não querem escutar. Era aquele tempo de rastros e tiros nas chapadas do Baixo Parnaíba.

 José Antonio Basto

 

 

 

 

 

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