segunda-feira, 28 de novembro de 2016

As palavras do índio Apinajé em defesa do seu território sagrado - (Seminário Nacional “MATOPIBA: conflitos, resistências e novas dinâmicas de expansão do agronegócio no Brasil” – Brasília, novembro de 2016)

José Antonio Basto e Antonio Apinajé - (CONTAG - Brasília-DF)
Antonio Apinajé é o nome dessa personalidade das florestas do Tocantins. Um homem inteligente, intelectual e, sobretudo informado das notícias que rondam o mundo, com seu rádio, sua TV, seus livros e jornais. Ele fazia sua fala no início do Seminário Nacional “MATOPIBA: conflitos, resistências e novas dinâmicas de expansão do agronegócio no Brasil” – realizado de 16 a 18/11/2016, na sede da CONTAG em Brasília-DF. Transcrevia sobre uma “abordagem histórica das ameaças e impactos ambientais sobre as comunidades tradicionais”. O MATOPIBA seria o ponto principal de sua indignação; um programa de autos investimentos estrangeiros e nacionais que visa ocupar a região do cerrado brasileiro com suporte no avanço incontrolável do capitalismo sobre o campo, sobretudo as especulação e espoliação de terras que são por direito dos povos indígenas e comunidades tradicionais. Mas essa política não é coisas dos dias atuais, o cerrado já tinha sido visado por programas do capital estrangeiro desde a década de setenta. Governos passados pretendiam a ocupação desse território, a exemplo do PRODECER – (Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados), assinado entre o Brasil e o Japão. O programa durou por mais de 35 anos. Hoje o cerrado, conhecido como berço das águas, onde se encontram cabeceiras dos principais rios brasileiros, estar sendo devastado pelo agronegócio e criação de gado. Esse espaço cultural deve ser protegido pelos povos que tiram sua alimentação da terra e das águas, precisam do cerrado para se reproduzir cultural e socialmente, segundo dados de algumas pesquisas de universidades e do movimento social afirmam que: 52% deste bioma já foi destruído, 62 litros de agrotóxicos são consumidos por ano pelas pessoas no Mato Grosso, 901 espécies da fauna e flora estão ameaçadas de extinção, o agronegócio expulsa os povos e comunidades tradicionais protetores da biodiversidade do cerrado, 6 bacias hidrográficas brasileiras são abastecidas pelas águas do cerrado, 80 etnias indígenas estão na região do cerrado. Esses são alguns índices que marcam a grande problemática das mudanças socioambientais no cerrado; sem a preservação desse bioma não teremos chuva para abastecer nossos rios, água para beber e lavar, nem alimentos da agricultura familiar em nossas mesas. O Seminário foi encabeçado pela Campanha nacional: Sem cerrado, sem água, sem vida. Durante o evento cheguei a conversar com o Antonio Apinajé, ele contara sobre sua experiência vivida na aldeia Areia Branca – município de Tocantinópolis –TO, suas crenças e modos de vida. Contara como nasceu seu povo apinajé há milhares de anos atrás: duas cabaças fora jogada no rio Tocantins e dali nascia o homem e a mulher, procriaram e deram frutos para a grande nação Apinajé que cresceu nas margens do Rio na região do Bico do Papagaio.  O sábio índio Apinajé informava que das 26 aldeias que compõem a reserva, uma das mais antigas e importante é a sua, a Areia Branca. Falava com gosto e convicção, muito participou das intervenções durante os três dias de seminário. Em todos os momentos, naturalmente ele compartilhava frações de sua sabedoria nata, os participantes silenciavam durante sua voz, ficávamos impressionados com tamanho grau de pura sabedoria. “Não somente sobre a vida indígena, mas também um lado politizado e informado – tanto no cenário nacional quanto internacional – que atropelaria o discurso cansado de qualquer intelectual de sala de aula”. “Não impressiona que um índio seja tão inteligente, pois pensar isso seria colocá-lo como um inferior o que realmente não é”, pois ainda temos muito que aprender com os indígenas, com os povos e comunidades que residem nesses territórios. “É de uma grandeza natural a inteligência do homem por si só, seja índio ou não”. Eis aí um grande clichê completamente desmantelado: a mídia e outros setores que tentam bagunçar a luta dos povos, sustenta o discurso intolerante de que o índio só sabe dos segredos da natureza”. Uma grande desinformação! A partir do contato com Antonio Apinajé e outras lideranças durante o seminário, índios e quilombolas -, percebi que a preocupação em estudar, buscar novos conhecimentos, manter-se atualizado e ligado nas mobilizações sociais que acontecem reserva e quilombo afora é de boa parte deles e delas. Como bem disse um deles, durante uma das nossas conversas, “eu cursei a universidade da vida, do cabo da enxada”, em outro momento, lista os inúmeros livros que leu ultimamente. As comunidades tradicionais que entre aspas são protegidas por lei, ainda tem muito que lutar pelos seus direitos. Algumas pequenas conquistas foram esquecidas pelos governos e ainda mais agora nesse momento de transformação política. A terra como instrumento de capital e poder, em especial tratando sobre o cerrado, hoje em dia passa por um processo de recolonizarão, desrespeito e desacatos aos direitos humanos. Existe um desafio para as Aldeias Apinajé, que é manter suas formas de vida tradicional em meio ao grande crescimento dos vários problemas em suas áreas que vai da grilagem de terras por parte de fazendeiros ao avanço do agronegócio por empresas desconhecidas.
José Antonio Basto
Militante em Defesa dos Direitos Humanos e da Vida
E-mail: bastosandero65@gmail.com
(98) 98607-6807







sexta-feira, 18 de novembro de 2016

CONSCIÊNCIA NEGRA XI - (Zumbido pela liberdade)




I
Cantavam um canto ecoando
Nos braços da luz voando...
O mais nobre sentimento,
Era um grito de agonia
Soando o som da magia
Contra as correntes do tempo.

II
A voz ainda gritava!
- Meu Deus onde eu estava!
Quando desapareci!
Os rastros pelo sertão
Combatentes da nação
Mudai as regras. Entendi!

III
Muitos papéis enrolaram
Trezentos anos se foram
De chibata e desrespeitos
Busquemos de longe o valor
De três séculos de dor
Maior tragédia defeitos.

IV
Cansados! Nunca, jamais!
- Cadê meus filhos e pais?
- Perguntava a voz outra vez
Sobre uma face estridente
Como as águas correntes
Emblemava a sensatez.

V
Ainda há sonhos por vir
Em leis que hão de florir
Na mão, na marra ou na dor!
Para que ainda esperar!
Se a vontade de lutar
É quem nos une em fervor.

VI
Fumaça corre nas ruas
A Constituição acentua
O direito unificado,
Companheiros de batalha
Aguçam e amole as navalhas...
- Capoeira vai gingando.

VII
Povos bisnetos dos “Bantus”
Acelerai os seus cantos...
Em agogôs e tambores,
Resgates dos ancestrais
Tocais os seus berimbais!
Denunciando os horrores.

VIII
Da carabina ao fuzil
Em moléculas que sentiu
Nada pode mais dizer,
Companheiros de batalhas
Preparai suas navalhas!
Porque nós vamos vencer!

IX
Jorra o sangue da história
Em atropelo a memória...
Nas terras do coração!
Nisso tudo o que mudou?
Nada na linha passou...
Ainda existe escravidão.

X
Neste enredo das vozes
Desafiaremos os algozes
Com fé, batalha e verdade,
Jovens, adultos e crianças...
Companheiros da esperança
Zumbidos da Liberdade”.

José Antonio Basto
Brasília-DF, 18 de novembro de 2016.
- Militante em defesa dos direitos humanos na Região do Baixo Parnaíba maranhense
(98) 98607-6807

- Essa é uma voz do povo negro brasileiro. Em homenagem ao “Dia Nacional da Consciência Negra” – 2016. Ao Seminário Nacional sobre os problemas socioambientais do MATOPIBA, realizado de 16 a 18/11/2016 em Brasília e, sobretudo aos 321 anos do assassinato de Zumbi dos Palmares. Acentuando ainda em especial a luta atual dos negros e negras rurais e urbanos, suas lutas e desafios em busca da concretização dos seus direitos civis. Autor.


quinta-feira, 10 de novembro de 2016

O que enche nossos sonhos de esperanças no chão de luta em que vivemos

     O destino do viajante que coordenara os representantes das comunidades do município de Urbano Santos era a cidade de Brejo. A velha cidade que no tempo de vila se tornara “quartel-general” dos corajosos rebeldes da insurreição dos balaios, ainda em 1839. Mas agora os tempos são outros. A reunião em 07/11/2016 seria uma audiência pública com os representantes do ITERMA – “Instituto de Terras do Maranhão” – em nome do Governo do Estado, com as comunidades que necessitam das regularizações fundiárias na Região do Baixo Parnaíba maranhense. Essas comunidades que já não aguentam mais esperar pelas vontades de quaisquer governos, desde os que passaram, o atual e os que hão de vir. Leonardo Boff, escritor, ativista ambiental e pai da Teologia da Libertação, dizia que “A luta pela Reforma Agrária é uma luta pela vida”. “Quando se trata da luta pela terra, pela água, pela segurança, por uma sociedade justa, igualitária e fraterna, estamos tratando da luta pela vida”, acrescentava Pe. Chagas, Pároco do município de Buriti de Inácia Vaz e coordenador do Fórum em defesa da vida do Baixo Parnaíba.
     A audiência começou com as várias e velhas denúncias dos representantes das comunidades dos municípios de Urbano Santos, Beláguas, São Benedito do Rio Preto, Chapadinha, Brejo, Milagres, Santa Quitéria, São Bernardo e Anapurus. Muitos problemas em todos os aspectos no que diz respeito às terras devolutas do Estado, terras soltas que esperam ser arrecadadas desde décadas passadas, são os trabalhadores e trabalhadoras rurais que moram nelas, por isso merecem respostas concretas do governo. O Território do Baixo Parnaíba, suas chapadas foram engolidas pelo agronegócio da soja e do eucalipto, basta olhar os grandes campos na estrada que liga Chapadinha à Anapurus e Brejo, o que antes era chapada, hoje só se ver deserto, aquelas áreas das comunidades tradicionais foram griladas por gaúchos e por outras empresas. A comunidade São João dos Pilões em Brejo que vive do artesanato do da fabricação de pilões, cumbucas e outros utensílios da madeira de pequi expostos na beira da estrada para a venda, não encontra mais a árvore em suas chapadas, suas áreas foram desmatadas pelos gaúchos, por isso compram troncos de pequi de outras regiões para a demanda dos pilões. O processo burocrático da conquista da terra pelos camponeses não é uma questão fácil, pois a luta não depende somente da vontade e da coragem dos lavradores, o Estado é o responsável pelo processo técnico e pela garantia da segurança e proteção dos homens e mulheres do campo.
     Os antecedentes de nossa história não marcam uma página bonita de se ver na luta pela terra no Estado do Maranhão – principalmente quando se fala dos camponeses pobres das comunidades rurais e quilombolas. Esse sentimento não é coisas de nossos dias atuais. Quando olhava o sertão da janela do carro que nos levou a Brejo, lembrava de quando o grupo do vaqueiro Raimundo Gomes e de Francisco dos Anjos (líderes da Balaiada (1838-1842), já se deslocavam de um lugar para outro combatendo naquela época com os grandes proprietários de terra, coronéis, latifundiários e o governo que oprimia os menos favorecidos e desprovidos de direitos. Os balaios lutavam por respeito, dignidade, pela vida, contra a escravidão... pela liberdade. Desafiaram o Império Regencial, mas como sempre, nosso estado repressor utilizou da força militar para massacrá-los. Restou em nosso meio a história de coragem dos caboclos rebeldes que deram os primeiros passos dessa batalha que se trava até os dias de hoje. A reunião foi proveitosa, no espaço de muitos encontros e eventos organizado pelas entidades de apoio ao movimento social, local esse que me refiro é o “Salão do Centro Diocesano de Brejo” – Seminário Santo Antonio. Em suas paredes estão mensagens de eventos e frases de solidariedade à nossa luta, a que mais me chamou a atenção foi o cartaz da Campanha da Fraternidade 2017, com o tema: “Biomas brasileiros em defesa da vida”. O evento terminava com as frases ecumênicas e românticas do Bispo D. Valdeci, que apelava para a organização dos trabalhadores, dos menos favorecidos, sustentando teses que lia na bíblia e contextualizando nas vivencias do dia-a-dia. Suas palavras e a experiência da coletividade nesta luta renhida travada desde séculos remotos é “O que enche nossos sonhos de esperanças no chão de luta em que vivemos”.  
 









José Antonio Basto
Militante em defesa dos direitos humanos pela Reforma Agrária

E-mail: bastosandero65@gmail.com