segunda-feira, 26 de novembro de 2018

PELAS COMUNIDADES DO BAIXO PARNAÍBA

Comunidade Bela Vista

Saiamos de uma reunião no Povoado Formiga – município de Anapurus, região do Baixo Parnaíba maranhense. Formiga fica entre Urbano Santos e Anapurus. Há algum tempo atrás todo esse sertão era território de Brejo.  A ideia era ajudar a Associação daquela comunidade no entendimento mínimo sobre “Direitos Humanos” – membros da direção da entidade faz o “Curso de Formação de Agentes Populares de Direitos”, com temas voltados para a política da proteção e pedagogia socioambiental. O que realmente foi feito – com participação direta dos companheiros lavradores. Formiga remonta a história do ciclo das fazendas, linha de transição por onde os balaios passaram; negro Cosme do Quilombo Lagoa Amarela atacava as fazendas das margens do Rio Preguiças em operações de libertação dos escravos cativos.

Reunião em Formiga - Anapurus
A memória prevalece e merece seu devido reconhecimento.  Teríamos outra importante tarefa, um compromisso de visitar o “Assentamento Bebedouro dos Calixtos”, com o intuito de informar sobre as últimas mudanças no cenário agrário, políticas voltadas para os assentados e, ainda mais aqueles agricultores (as) que estão no processo de construção de suas habitações e linhas de créditos. Eles precisavam de orientação. Na estrada que cortava os grandes campos de eucalipto e soja, nos deparávamos com a bela chapada em resistência – bacurizeiros e pequizeiros carregados de frutos, esperança de uma gorda safra assim que o inverno chegar. A Comunidade Bela Vista não recebera esse nome por acaso – pois é mesmo uma “bela vista” da natureza. Nascera no meio da chapada e se desenvolvera ao longo do tempo. Parávamos ali para descansar à sombra de um pequizeiro. Seguíamos
viagem passando pelo São Cosme, Cajazeiras, Todos os Santos e Bebedouro, a reunião acontecia já no final da tarde. O processo de Bebedouro
Sr. Calixto - "Comunidade Bebedouro dos Calixtos".
vai andando com altos e baixos, atravessando avalanches e barreiras. Lutar pela permanência e acesso à terra nunca foi tarefa fácil, lutar pelos direitos dos trabalhadores é necessário militância. Concluía-se a roda de conversa. Voltávamos pelos caminhos aplainados e transformados. Descia pela estrada do Povoado Pedra Grande e rumava para a sede da cidade com a sensação de dever cumprido.


José Antonio Basto



segunda-feira, 12 de novembro de 2018

ELES MERECIAM UM NOBEL

Reuniao em Bacabal - Urbano Santos
Eles são merecedores de um "Prêmio Nobel" -, caso existissem Nobel para quem faz alguma diferença na vida das comunidades tradicionais na amazônia e no cerrado brasileiro; caso tivéssemos influência nas votações e burocracia do Nobel. Eles tem ajudado 
bastante nas questões que diz respeito à renda familiar, monitoramento e proteção
ambiental e desenvolvimento sustentável na vida das famílias camponesas. O jornalista Mayron Regis e o agrônomo Edimilson - ambos
do Fórum Carajás - entidade essa de cunho social e não governamental que trabalha junto às comunidades tradicionais do Maranhão, Pará e Tocantins com relação aos impactos ambientais dos grandes projetos. Eles já fizeram e fazem muito pelas comunidades da campo e das florestas. 
Ajudam quando podem, enfrentam avalanches e crises financeiras; 
mas continuam na labuta da vida. São profissionais e ao mesmo tempo militantes em defesa da vida e de um mundo melhor para os camponeses e extrativistas. Eu tomo a 
liberdade de falar desses dois amigos -, faço, com todo respeito uma crítica positiva porque já os conheço de longa data, das lutas e batalhas que estivemos
lado a lado levando informações e algo mais, para as áreas de conflitos. Reuniões e seminários que participamos em vários
pontos desse Baixo Parnaíba de meu Deus, que partia de um simples almoço de galinha caipira a um papo de orientação da comunidade
animando-a na dinâmica de enfrentamento ao latifúndio e em defesa da terra. Os projetos de galinha caipira já instalados só no município de Urbano
Santos pelo Fórum Carajás, podemos lembrar dos povoados: São Raimundo, Mangabeirinha, Juçaral, São Bento, Santa Rosa
Cajueiro, Serraria, Gonçal dos Mouras, Baixa Grande, Tocão e Porto Velho I... Iniciativas que muito têm contribuído 
na renda das famílias beneficiadas, tanto na mudança de hábitos para melhor, quanto na manutenção e permanência em suas terras. Com positividade
eles seguem avante, por esse imenso território agrário do Baixo Parnaíba - levando mudas e galinheiros - ajudando os mais humildes. Trilhando por esses chapadões. Os 
governos não reconhecem o tanto que estes dois fazem pelos homens e mulheres do campo - seguem suas consciências. Não fazem tanto, mas
tentam fazer ao máximo, para com esses gestos, atos e ações engrandecer suas personalidades? Não. Para mostrar" que com pouco se pode faz muito", basta querer e ter força de vontade. 
Nossas comunidades sabem do valor que eles tem - porque convivem direto, porque eles tem espirito de humildade, de pessoas
com sensibilidade de ajudar o próximo; os mais necessitados... Os esquecidos e desprovidos de direitos. Na convicção do cronista: o Mayron e o Edimilson mereciam o PRÊMIO NOBEL DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. Se caso existisse essa categoria. Porque em nome das comunidades tradicionais eles merecem muito 
mais pelo que tem feito.

José Antonio Basto 

terça-feira, 6 de novembro de 2018

O verdadeiro documento da terra em Gonçal dos Mouras




Pov. Gonçal dos Mouras
A Pequena comunidade Gonçal dos Mouras fica entre Urbano Santos e Barreirinhas. Saímos de Urbano Santos para fazer uma reunião com os moradores, reunião essa que alimentaria a ideia de criação da Associação dos moradores. Por que eles se interessariam em criar uma associação, se já moram lá há décadas? Saberiam da história de luta e conflitos em defesa da terra? Entenderiam a própria história – realidade essa de muitas outras comunidades rurais do Baixo Parnaíba que passaram por essa mesma experiência. Gelson Rodrigues da Silva, mais conhecido como Gelson Ferreira – herdara esse sobrenome porque seu pai exercia a profissão de ferreiro, homem de baixa estatura e fala ligeira e de boa memória – contara com detalhes a tradição de sua família desde o seu bisavó que nascera em Gonçal. Gelson tem 77 anos de idade e cresceu ouvindo as historias da questão da terra onde mora.
Gelson Ferreira - Pov. Gonçal dos Mouras
Seu pai já defendia o território, pois sabia que sua família crescia no lugar. Se seu bisavó nascera em Gonçal, os antecedentes de luta e ocupação da área data ainda do século XIX. Gelson cresceu na fartura de tudo, contava emocionadamente que naquele tempo existiam muitas matas para fazer roça, muito bacuri nas chapadas; peixe no rio era com abundancia – quase nada disso existe mais. A terra era pública, de todos, para todos... Ninguém cobrava nada de ninguém. As disputas já vinham desde a primeira geração ainda na época de seu avó. Seu pai cresceu na questão. A terra foi conquistada pelas famílias do pai e da mãe de Gelson Ferreira. Trabalhavam em conjunto para sobrevivência.
Se passou um tempo, nos anos 60 e 70 a fumaça da questão voltou a pegar fogo novamente, um determinado sujeito chegava lá para tomar posse da érea onde as famílias moravam e trabalhavam; a pessoa que dizia ser proprietário tentou utilizar da violência para intimidar os lavradores, resistiram de várias formas e continuaram na área. Casas foram queimadas e reconstruídas, os camponeses foram expulsos e voltaram. Uma guerra foi travada, de um lado o latifundiário, do outro as famílias agricultoras. A comunidade sem saber do que estava acontecendo, se mantinha dentro do território, mas as articulações iam além dos órgãos jurídicos da época. Com isso os camponeses começaram a se organizar na CEB (Comunidade Eclesial de Base), mas próxima, CEB da Tabocas. Entenderam ali que eram cidadãos de direito, pois a terra, seu bem maior precisava ser defendida com unhas e dentes, os coordenadores anunciavam nas leituras um mundo novo. Se mantiveram no lugar por muito tempo, plantando e  colhendo até dos dias de hoje.

José Antonio Basto