segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

AUDIÊNCIA PÚBLICA NA COMUNIDADE SÃO RAIMUNDO – MUNICÍPIO DE URBANO SANTOS, BAIXO PARNAÍBA. (APRESENTAÇÃO DA NORMA CONJUNTA DA ASSOCIAÇÃO COMUNITÁRIA DO POVOADO SÃO RAIMUNDO, DA ASSOCIAÇÃO COMUNITÁRIA GABRIEL ALVES DE ARAÚJO (POVOADO BRACINHO), ASSOCIAÇÃO COMUNITÁRIA DO POVOADO BOM PRINCÍPIO E ASSOCIAÇÃO COMUNITÁRIA DO POVOADO BOA UNIÃO I PARA A PROTEÇÃO, PRESERVAÇÃO E USO SUSTENTÁVEL DO BACURI, DO PEQUI E OUTROS RECURSOS MINERAIS, VEGETAIS E ANIMAIS).

Bacuri do São Raimundo
Um trabalho em conjunto que já vinha sendo alimentado desde algum tempo atrás pelas comunidades tradicionais da região visando a defesa do cerrado e a permanência das práticas tradicionais na agricultura e manejos no extrativismo vegetal. A Norma Conjunta encabeçada pelas quatros associações das Comunidades São Raimundo, Bracinho, Bom Princípio e Boa União I, o projeto tem como objetivo a defesa do território,  preservação e uso sustentável do bacuri, pequi e outros recursos minerais, vegetais e animais. Pois os moradores dessas e outras comunidades vizinhas necessitam diretamente destes recursos para sobreviverem e se reproduzirem social e culturalmente.
A ideia surgiu com ênfase na elaboração coletiva de um documento oficial que rege principalmente sobre a “proibição da derrubada” do fruto do bacuri verde nesse período de safra. Sendo a colheita do bacuri uma das atividades fonte de renda das famílias camponesas que habitam as chapadas. Com o texto preparado sob orientações da SMDH – Sociedade Maranhense dos Direitos
Participantes da Audiência 
Humanos e apoio do STTR de Urbano Santos, resolve-se alargar os capítulos dando assim um entendimento mais amplo da proteção de uma toda biodiversidade. Com base em leis estaduais, federais e na própria Constituição de 1988, o documento subdivide-se nos seguintes subtítulos: “DA PRESERVAÇÃO DO BACURI, DO PEQUI E OUTROS RECURSOS AMBIENTAIS (MINERAIS, VEGETAIS E ANIMAIS; DAS CONDUTAS PROIBIDAS E PENALIDADES; DA FISCALIZAÇÃO E DISPOSIÇÕES GERAIS”. No final, os presidentes destas associações assinam o texto para embasamento jurídico. Com um proposito de divulgar o projeto para os órgãos competentes e outras comunidades, foi sugerido a realização desta audiência pública com a presença do Ministério Público Federal, na pessoa do Promotor de Urbano Santos.
Domingos - liderança do São Raimundo, discussão do tema
Esteve ainda presente no evento lideranças comunitárias, militantes dos direitos humanos, da reforma agrária, ativistas ambientais, vereadores, diretoria do STTR e moradores das comunidades rurais.  O evento foi proveitoso e sobretudo um compartilhamento de experiências ímpares, nas informações sobre questões socioambientais – impactos ambientais com o avanço da monocultura e espoliações das terras e dos camponeses que habitam o território há séculos. A implantação do agronegócio com as plantações de eucaliptos e soja sempre foi um problema enfrentado pelas comunidades tradicionais. O capitalismo no campo e a grilagem de terras são fenômenos que se perpetuam desde séculos remotos e tem como base o poder econômico do capital para desenvolvimento dos seus interesses particulares, gerando então um todo retrocesso de modificações nas paisagens e nos modos de vida tradicionais das comunidades rurais.
Promotor Dr. Felipe - parecer final de apoio à causa
São Raimundo foi escolhido pela história de resistência que tem em defesa de sua área, um exemplo de luta em toda região do Baixo Parnaíba maranhense, no estado e no país. O cerrado deve ser protegido pelas comunidades que nele moram, as chapadas são espaços importantes para o equilíbrio ambiental. Um bioma rico com muitas variedades de frutos, de ervas medicinais, caças e nascentes de rios, grotas e riachos. Infelizmente é tratado pelo programa devastador do agronegócio como um espaço pobre e vazio, que na verdade nunca foi. O Promotor de Justiça (Ministério Público Federal), deu parecer final com seu apoio jurídico na causa, baseando-se nos princípios e normas de SUSTENTABILIDADE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E SOLIDÁRIO.

José Antonio Basto
E-mail: bastosandero65@gmail.com


segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

O casual encontro com os bacuris

José Antonio Basto - (Chapada do Pequi-U. S)
Ela tinha vontade de comer pequi com galinha caipira; mas onde acharia pequi nesse tempo. É tempo de pequi? De fevereiro a maio eles desabam no chão. A Vanessa diria que para as bandas da chapada da Comunidade Pequi, haveríamos de achar os frutos populares do cerrado, naquela imensa chapada ainda pouca visitada. Sairíamos cedo com o tempo bastante neblinado, um sereno leve e as estradas cheias de lagoas, pois a chuva da noite anterior tinha sido forte e com certeza haveríamos de encontrar os pequis, todavia encontramos os bacuris.
O destino pelas chapadas a procura dos pequis se transformara num encontro casual com os bacuris – aquela chapada ainda não explorada como poucas pelo Baixo Parnaíba. Com particularidades, comumente se ver pequi com bacuris entrelaçados – já por ali ao em vez de encontrá-los, deparamo-nos com os bacurizeiros. Encontrava-se também extrativistas circulando nas veredas com suas bicicletas a procura dos bacuris -  a massa (polpa) já chegara a vinte reais no mercado, eles acharam muitos bacuris, pois os jacás estavam cheios dos frutos amarelos. A chapada do Pequi entre as extremidades das comunidades Riacho Seco e São José sempre foi rica em tudo, território de posseiros que inda não foi vendido para o agronegócio – gaúchos já estão de olho na área. Muito pasto, madeira, capim silvestre e caça...  É uma das poucas da região que concentra grandes áreas de bacurizais e outros importantes frutos do cerrado. Encontrava-se bacuri aqui e acolá e nada dos pequis, por que não encontra-los, estavam em extinção? A questão é que cada chapada tem suas particularidades. A princípio se pensava que não se achava tanto... talvez um número suficiente para comer com farinha ou fazer um suco após o almoço. A cada momento aparecia os bacuris espalhados sobre o chão da chapada, muita mutuca e maruim. A chuva aumentava a cada momento. Caia mais bacuris e nada de encontrar os pequis, teríamos que achá-los de qualquer jeito, mas o destino nos reservava algo diferente: os bacurizeiros que apareciam a cada momento pela frente nos dava a graça de encher os cestos.
Deixávamos a chapada por causa da chuva tensa já por volta do início da tarde, o tiracolo com os bacuris sobre a garupa da motocicleta balançava, uma hora caiu num areal, - baixa de área. A chapada ficava lá, num clima de paz e de saudades. Meus avós a herdaram muito antes de eu ter nascido;  ficaram para meus pais. Hoje ela produz seus frutos, os frutos da natureza que é do bem coletivo das comunidades tradicionais. A trajetória do procura dos pequis se transformara num casual encontro com os bacuris. É fácil beber o suco do bacuri já pronto geladinho como se bebe nas lanchonetes– difícil é colhê-los nas chapadas.


José Antonio Basto 

terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

O Viajante que falava de reformas

O Viajante se perguntava por onde estava andando e o que na verdade estava fazendo por aquelas bandas do leste, ele conhecia muitas coisas por sua experiência de luta. Uma vez um camponês falava sobre os problemas da região dominada pelo agronegócio do soja e eucalipto. Muitas coisas aconteciam por ali, grandes sonhos foram planejados no romantismo das causas mais importantes da história. Os cânticos soavam pelas veredas do sertão no sanfonar do acalanto d`alma. Os camponeses que fazem da terra seu espaço de luta, sobreviviam no respirar do chão.
O Viajante enveredava pelo agreste das causas mais humanas – por tanto caminhar, chegara numa vila e ali perguntou aos moradores se sentiam fome -, já era noite, os anfitriões disseram que sim – então preparam um rango de galinha caipira. Alguém perguntava após o jantar o que ele fazia falando de reforma agrária, esta coisa que se fala desde 500 anos atrás. Outra voz completava a mesma pergunta: - Senhor nós fomos esquecidos e injustiçados, não temos ninguém ao nosso lado, apenas Deus, o que faremos?  - “Vocês poderão vencer qualquer batalha em qualquer aspecto da vida se descobrir o verdadeiro valor da união” - respondeu o viajante. A conversa foi longa no terreiro da casa humilde de taipa naquela noite de lua.  Sob a luz de lamparina ele lembrava da origem e dos tempos difíceis que passara, tempos esses considerados um dos períodos mais importantes de toda sua formação. O dia amanhecia com o cantar do galo, após o café, os apetrechos eram colocados ao lombo do cavalo e seguia avante. Galopava pelos caminhos conhecendo a região que tão pouco conhecia, logo próximo - encontrou um caçador: - Donde vens companheiro? – da caçada, mas não matei nada, não existe mais coisa alguma em nossas áreas, foi tudo destruído – disse ele. O sentimento de angústia do caçador por não encontrar seu meio de sobrevivência deixava claro a desgraça causada pelo capitalismo no campo, o grau de intolerância desse grande capital que tanto maltrata as comunidades tradicionais.
O Viajante continuava marchando, mais na frente se deparou com os fornos de carvão, entendeu que o carvão trabalhado e produzido pela mão de obra escrava dos trabalhadores era a madeira nativa do cerrado: madeiras que serviam para os moradores das comunidades fazerem suas casas. Também por ali não existe mais palha para cobrir as casas – porque os babaçuais foram dizimados por completo. Um campo aberto no meio da chapada assombrava o Viajante, aos beirais frisava-se os bacurizeiros mortos, pois o bacuri não tem como produzir fruto em meio aos eucaliptos, muito menos sozinho sem outras espécies e insetos de polinização.
O conflito se arrasta, muitas lutas se deram, perdas e vitórias foram gravadas no decorrer do tempo. O Viajante já terminando seu percurso, pensava sozinho na grande desigualdade social das comunidades rurais, onde se falta tudo.  A terra de interesse comum, por não ser de ninguém e ao mesmo tempo de todos, a terra foi invadida e saqueada - precisa-se de apoio! A união é a base de tudo para os povos e comunidades que defendem seus territórios. É do chão que tiram o alimento de suas famílias e alimentam suas almas para se fortalecerem rumo a novas investidas, elas continuam formando seus bastiões de guerra! O Viajante termina sua simples e modesta tarefa de ter falado das reformas abrindo os olhos dos camponeses; eles não leram nada dos textos e livros que levou nos bornais, eram analfabetos, mas por onde passou ouviram com atenção suas palavras.

José Antonio Basto

E-mail: bastosandero65@gmail.com